O presente texto, do Tribuna da Guanabara, irá discorrer sobre o novo Projeto de Emenda Parlamentar que foi recém aprovado em 2 turnos pela Câmara dos Deputados, suas modificações e abrangência. Além disso, o texto irá apresentar-lhes como funciona o processo de Emenda Constitucional descrito na Constituição Federal e outros mecanismos constitucionais.
Boa Leitura!
Na data 16/09/25, foi-se aprovado na Câmara dos Deputados, por 2 turnos, a PEC 03/21, que altera algumas prerrogativas parlamentares. Antes de adentrar nesse assunto gostaria de explicar-lhe, caro leitor, o que é, de fato, esse dispositivo constitucional. PEC é um acrônimo para Projeto de Emenda Constitucional, que, é uma função exclusiva do chamado Poder Constituinte Derivado Reformador (Congresso Nacional), que através de regras estabelecidas na própria Constituição Federal, altera o texto constitucional estabelecido pelo Poder Constituinte Originário (Assembleia Constituinte). A principal diferença entre esses PODERES é que este é classificado como ILIMITADO, pois não há algum vínculo legal que o impeça de estabelecer uma regra constitucional justamente porque é ele que faz nascer uma nova ordem constitucional. Já aquele, juridicamente, é LIMITADO porque há certas limitações expressas no próprio texto constitucional. Nisso, aproveitando esse conceito, vamos contextualizá-lo para a realidade brasileira.
– Da Emenda à Constituição
As regras para modificar a atual Constituição Federal se encontram no Art. 60. São justamente essas regras que limitam o Poder Constituinte Derivado Reformador, que, no nosso caso, é o Congresso Nacional, isto é, se uma PEC não respeitar qualquer requisito disposto no referido artigo, ela sofrerá um vício (erro) e será declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal através de uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) – de acordo com o Art. 102, inc. I, alínea a. Por via de curiosidade, os agentes competentes para propor ao STF uma ADI estão descritos no Art. 103.
Art. 60 – A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
– Das Limitações
As limitações ao poder de reforma são:
– Formais:
– Iniciativa (Art. 60, incs. I, II e III)
I) de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
II) do Presidente da República;
III) de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.
– Quórum (Art. 60, § 2º)
§ 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em 2 turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, 3/5 dos votos dos respectivos membros.
– Promulgação (Art. 60, § 3º)
§ 3º A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem.
– Rejeição (Art. 60, § 5º)
§ 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.
– Circunstanciais (Art. 60, § 1º):
§ 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.
– Materiais (Art. 60, § 4º):
Essas são as famosas Cláusulas Pétras:
§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I) a forma federativa de Estado;
II) o voto direto, secreto, universal e periódico;
III) a separação dos Poderes;
IV) os direitos e garantias individuais.
Como você pode ver, caro leitor, o rito para se modificar a Constituição Federal é muito específico e bem difícil de se alcançado. É por isso que a CF/88 é classificada como RÍGIDA. O disposto no § 2º expressa bem essa dificuldade pois esse PROJETO deve ser aprovado 2 vezes na Câmara de Deputados – alcançando, no mínimo, 308 dos 513 deputados federais – e, 2 vezes no Senado Federal – devendo ser concordado por, pelo menos, 49 dos 81 senadores.
O referido Projeto de Emenda à Constituição foi elaborado em 2021 e tem como principal autor o deputado federal Celso Sabino que, na época da propositura deste Projeto, era filiado ao PSDB-PA. Em 2022, desligou-se do partido e, no mesmo ano, filiou-se ao PSL-PA, que, novamente, desfiliou-se e se associou ao UNIÃO BRASIL-PA sendo eleito para deputado federal nas eleições nacionais do referido ano. Porém, licenciou-se do cargo ao qual foi eleito para assumir o cargo de Ministro do Turismo no dia 03/02/2025. Infelizmente, já se é público e notório essa prática dos políticos do Brasil. O eleitor confia em um determinado candidato para representar seus interesses no Congresso Nacional, mas, ao colocar preferencias pessoais acima das necessidades da coletividade à qual recebeu voto, assume outro cargo político.
Assim sendo, a PEC 03/21, em 1º turno, alcançou 353 votos a favor e 134 votos contra. 26 Deputados Federais não votaram. Já no 2º turno, foram 344 votos a favor e 133 contra, sendo que 36 se abstiveram. Agora, seguindo a regra do Quórum (Art. 60, § 2º), para ser promulgada, ela precisa ser aprovada pelo Senado Federal. Esse é justamente sua situação atual: aguardando apreciação pelo Senado Federal. Para acessar o texto original, basta clicar nesse link.
Ela foi batizada de PEC DA IMUNIDADE ou PEC DA BLINDAGEM porque ela NÃO PROTEGE VOCÊ, DELES! Você quer um exemplo? Por que não se foi votado projetos mais prioritários para a sociedade como o RECALL DE MANDATO ou o VOTO DE NÃO CONFIANÇA? Ou o Ato Revogatório Popular (PEC 226/2016) ou a Redução da Maioridade Penal (PEC 01/2024)? Ela foi chamada de PEC DA IMUNIDADE ou PEC DA BLINDAGEM porque ELA PROTEGE ELES, DE VOCÊ!
Para resumir, o texto aprovado pela Câmara dos Deputados altera os arts. 53 e 102, isto é, modifica as prerrogativas dos parlamentares e as competências do Supremo Tribunal Federal. Ela aumenta a proteção do infame “Foro Privilegiado” ou “Foro por Prerrogativa de Função”, colocando mais uma barreira de proteção. Vale destacar que esse instituto foi uma maneira que o Poder Constituinte Originário (Assembleia Constituinte) encontrou de proteger o Parlamentar em função de seu cargo, por exemplo: se o Deputado Federal ou Senador realizar um ato ilícito determinado, ele não será julgado nos tribunais de 1º instância como você, caro leitor. No atual texto da Constituição Federal federal, ele se encontra da seguinte forma:
– Foro por Prerrogativa de Função
Art. 53 – Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.
§ 1º Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal.
Art. 102 – Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I) processar e julgar, originariamente:
b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República;
Lembrando que os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e o PGR (Procurador-Geral da República) são escolhidos e examinados por alguns desses agentes descritos na alínea b do inc. I do Art. 102, isto é, eles elegem seus próprios fiscais.
– Escolha de Ministro do STF e do PGR
Art. 101 – O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de setenta anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada.
Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.
Art. 128 – O Ministério Público abrange:
§ 1º O Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e cinco anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida a recondução.
Art. 84 – Compete privativamente ao Presidente da República:
XIV) nomear, após aprovação pelo Senado Federal, os Ministros do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores, os Governadores de Territórios, o Procurador-Geral da República, o presidente e os diretores do banco central e outros servidores, quando determinado em lei;
Art. 52 – Compete privativamente ao Senado Federal:
III) aprovar previamente, por voto secreto, após arguição pública, a escolha de:
a) Magistrados, nos casos estabelecidos nesta Constituição;
e) Procurador-Geral da República;
– Das Modificações
As novas proteções aos Deputados Federais e Senadores serão as seguintes:
1) Só poderão sofrer medidas cautelares de natureza pessoal ou real durante o julgamento no STF;
1.1) Medidas Cautelares de Natureza Pessoal: são aquelas que afetam a pessoa.
Ex: comparecimento obrigatório em juízo, recolhimento domiciliar, restrição do direito de ir e vir.
1.2) Medidas Cautelares de Natureza Real: são aquelas que afetam o objeto.
Ex: sequestro de bens, multa, busca e apreensão.
2) Só poderão ser presos em caso de flagrante delito de crime inafiançável após votação secreta da respectiva casa, em até 24h, que deverá ser aprovada pela maioria absoluta de seus membros.
2.1) Os crimes inafiançáveis se encontram na Constituição Federal. São eles:
Ex: Racismo (Art. 5, XLII); Tortura, Tráfico, Terrorismo e Hediondo (Art. 5, XLIII); Ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (Art. 5, XLIV);
3) Só poderão ser processados criminalmente após votação secreta da respectiva casa, em até 90 dias, que deverá ser aprovada pela maioria absoluta de seus membros.
Além disso, ela estende o “Foro por Prerrogativa de Função” aos Presidentes Nacionais de partidos políticos com representação no Congresso Nacional, ou seja, mais pessoas serão protegidas pelo “Foro Privilegiado”.
A justificativa para o projeto é o fortalecimento da imunidade parlamentar contra arbítrios ou excessos do Poder Executivo ou do Poder Judiciário.
Agora, eu lhe pergunto, caro leitor, e você? Não participa desse processo? Que Estado é esse que se denomina “Democrático”, mas a população não participa de nada? Por que não há, no próprio Art. 60, um § 6º, por exemplo, com o seguinte texto:
Art. 60…
§ 6º. A Emenda à Constituição só surtirá efeito após aprovação da população através do Referendo de Confirmação por Iniciativa Popular a ser convocado pelo Congresso Nacional. Caso seja rejeitada, respeitar-se-á o disposto no § 5º.
Omissão? Ingenuidade dos constituintes da Assembleia de 1987? Negligência? Indiferença dos parlamentares que possuem a função constitucional de representar nossos interesses no Congresso Nacional?
Bom, caro leitor, uma coisa é certa: esse Estado arbitrário vai passar, a PEC 03/21, caso seja promulgada, vai continuar por 4, 8, 12, 16, 20 anos…
Clique nesse link para que vocês saberem quais Deputados Federais votaram A FAVOR da PEC DA IMUNIDADE ou PEC DA BLINDAGEM.
OBS: A PEC 03/21 foi REJEITADA pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado!
Obrigado e até o próximo texto.
“Para que o mal vença, basta o silêncio dos bons” (Edmund Burke)